Reunião de Estudo: Livro dos Médiuns (7)

Ano VII - 31/05/2011
CAPÍTULO IV - DOS SISTEMAS (PARTE 3)

49. Sistema multispírita ou polispírita. - Todos os sistemas a que temos passado
revista, sem excetuar os que se orientam no sentido de negar, fundam-se em algumas
observações, porém, incompletas ou mal interpretadas. Se urna casa for vermelha de um
lado e branca do outro,' aquele que a houver visto apenas por um lado afirmará que ela é
branca, outro declarará que é vermelha. Ambos estarão em erro 'e terão razão. No
entanto, aquele que a tenha visto dos dois lados dirá que a casa é branca e vermelha e só
ele estará com a verdade. O mesmo sucede com a opinião que se forme do Espiritismo:
pode ser verdadeira, a certos respeitos, e falsa, se se, generalizar o que é parcial, se se
tomar como regra o que constitui exceção, como o todo o que é apenas a parte. Por isso
dizemos que quem deseje estudar esta ciência deve observar muito e durante muito
tempo. Só o tempo lhe permitirá apreender os pormenores, notar os matizes delicados,
observar uma imensidade de fatos característicos, que lhe serão outros tantos raios de
luz. Se, porém, se detiver na superfície, expõe-se a formular juízo prematuro e,
conseguintemente, errôneo.
Eis aqui as conseqüências gerais deduzidas de uma observação completa e que
agora formam a crença, pode-se dizer, da universalidade dos espíritas, visto que os
sistemas restritivos ano passam de opiniões insuladas:
1º Os fenômenos espíritas são produzidos por inteligências extracorpóreas, às
quais também se dá o nome de Espíritos;
2º Os Espíritos constituem o mundo invisível; estão em toda parte; povoam
infinitamente os espaços; temos muitos, de contínuo, em torno de nós, com os quais nos
achamos em contacto;
3º Os Espíritos reagem incessantemente sobre o mundo físico e sobre o mundo
moral e são uma das potências da Natureza;
4º Os Espíritos não são seres à parte, dentro da criação, mas as almas dos que
hão vivido na Terra, ou em outros mundos, e que despiram o invólucro corpóreo; donde
se segue que as almas dos homens são Espíritos encarnados e que nós, morrendo, nos
tomamos Espíritos;
5º Há Espíritos de todos os graus de bondade e de malícia, de saber e de
ignorância;
6º Todos estão submetidos à lei do progresso e podem todos chegar à perfeição;
mas, como têm livre-arbítrio, lá chegam em tempo mais ou menos longo, conforme seus
esforços e vontade;
7º São felizes ou infelizes, de acordo com o bem ou o mal que praticaram
durante a vida e com o grau de adiantamento que alcançaram. A felicidade perfeita e
sem mescla é partilha unicamente dos Espíritos que atingiram o grau supremo da
perfeição;
8º Todos os Espíritos, em dadas circunstâncias, podem manifestar-se aos
homens; indefinido é o número dos que podem comunicar-se;
9º Os Espíritos se comunicam por médiuns, que lhes servem de instrumentos e
intérpretes;
10º Reconhecem-se a superioridade ou a inferioridade dos Espíritos pela
linguagem de que usam; os bons sé aconselham o bem e só dizem coisas proveitosas;
tudo neles lhes atesta a elevação; os maus enganam e todas as suas palavras trazem o
cunho da imperfeição e da ignorância.
Os diferentes graus por que passam os Espíritos se acham indicados na Escala
Espírita (O Livro dos Espíritos, parte II, capítulo I, n. 100). O estudo dessa
classificação é indispensável para se apreciar a natureza dos Espíritos que se
manifestam, assim como suas boas e más qualidades.

50. Sistema da alma material. - Consiste apenas numa opinião particular sobre a
natureza íntima da alma.
Segundo esta opinião, a alma e o perispírito não seriam distintos uma do outro, ou,
melhor, o perispírito seria a própria alma, a se depurar gradualmente por meio de
transmigrações diversas, como o álcool se depura por meio de diversas destilações, ao
passo que a Doutrina Espírita considera o perispírito simplesmente como o envoltório
fluídico da alma, ou do Espírito. Sendo matéria o perispírito, se bem que muito etérea, a
alma seria de uma natureza material mais ou menos essencial, de acordo com o grau da
sua purificação.
Este sistema não infirma qualquer dos princípios fundamentais da Doutrina
Espírita, pois que nada altera com relação ao destino da alma; as condições de sua
felicidade futura são as mesmas; formando a alma e o perispírito um todo, sob a
denominação de Espírito, como o gérmen e o perisperma o formam sob a de fruto, toda
a questão se reduz a considerar homogêneo o todo, em vez de considerá-lo formado de
duas partes distintas.
Como se vê, isto não leva a conseqüência alguma e de tal opinião não
houvéramos falado, se não soubéssemos de pessoas inclinadas a ver uma nova escola no
que não é, em definitivo, mais do que simples interpretação de palavras. Semelhante
Opinião, restrita, aliás, mesmo que se achasse mais generalizada, não constituiria uma
cisão entre os espíritas, do mesmo modo que as duas teorias da emissão e das
ondulações da luz não significam uma cisão entre os físicos. Os que se decidissem a
formar grupo à parte, por uma questão assim pueril, provariam, só com isso, que ligam
mais importância ao acessório do que ao principal e que se acham compelidos à
desunião por Espíritos que não podem ser bons, visto que os bons Espíritos jamais
insuflam a acrimônia, nem a cizânia. Daí o concitarmos todos os verdadeiros espíritas a
se manterem em guarda contra tais sugestões e a não darem a certos pormenores mais
importância do que merecem. O essencial é o fundo.
Julgamo-nos, entretanto, na obrigação de dizer algumas palavras acerca dos
fundamentos em que repousa a opinião dos que consideram distintos a alma e o perispírito. Ela se baseia no ensino dos Espíritos, que nunca divergiam a esse respeito. Referimo-nos aos esclarecidos, porquanto, entre os Espíritos em geral, muitos há que não sabem mais, que sabem
mesmo menos do que os homens, ao passo que a teoria contraria é de concepção
humana. Não inventamos, nem imaginamos o perispírito, para explicar os fenômenos.
Sua existência nos foi revelada pelos Espíritos e a experiência no-la confirmou (O Livro
dos Espíritos, n. 93). Apóia-se também no estudo das sensações dos Espíritos (O Livro
dos Espíritos, n. 257) e, sobretudo, no fenômeno das aparições tangíveis, fenômeno
que, de conformidade com a opinião que estamos apreciando, implicaria a solidificação
e a desagregação das partes constitutivas da alma e, pois, a sua desorganização.
Fora mister, além disso, admitir-se que esta matéria, que pode ser percebida
pelos nossos sentidos, é, ela própria, o principio inteligente, o que não nos parece mais
racional do que confundir o corpo com a alma, ou a roupa com o corpo. Quanto à
natureza intima da alma, essa desconhecemo-la. Quando se diz que a alma é imaterial,
deve-se entendê-lo em sentido relativo, não em sentido absoluto, por isso que a
imaterialidade absoluta seria o nada. Ora, a alma, ou o Espírito, são alguma coisa.
Qualificando-a de imaterial, quer-se dizer que sua essência é de tal modo superior, que
nenhuma analogia tem com o que chamamos matéria e que, assim, para nós, ela é
imaterial. (O Livro dos Espíritos, ns. 23 e 82).

51. Eis aqui a resposta que, sobre este assunto, deu um Espírito:
"O que uns chamam perispírito não é senão o que outros chamam envoltório material fluídico. Direi, de modo mais lógico, para me fazer compreendido, que esse fluido é a perfectibilidade dos sentidos, a extensão da vista e das idéias. Falo aqui dos Espíritos elevados. Quanto aos Espíritos inferiores, os fluidos terrestres ainda lhes são de todo inerentes; logo, são, como vedes, matéria. Daí os sofrimentos da fome, do frio, etc., sofrimentos que os Espíritos superiores não podem experimentar, visto que os fluidos terrestres se acham depurados em torno do pensamento, isto é, da alma. Esta, para progredir, necessita sempre de um agente; sem agente, ela nada é, para vós, ou, melhor, não a podeis conceber. O perispírito, para nós outros Espíritos errantes, é o agente por meio do qual nos comunicamos convosco, quer indiretamente, pelo vosso corpo ou pelo vosso perispírito, quer diretamente, pela vossa alma; donde, infinitas modalidades de médiuns e de comunicações.
"Agora o ponto de vista científico, ou seja: a essência mesma do perispírito. Isso
é outra questão. Compreendei primeiro moralmente. Resta apenas uma discussão sobre
a natureza dos fluidos, coisa por ora inexplicável. A ciência ainda não sabe bastante,
porém lá chegará, se quiser caminhar com o Espiritismo. O perispírito pode variar e
mudar ao infinito. A alma é o pensamento: não muda de natureza. Não vades mais
longe, por este lado; trata-se de um ponto que não pode ser explicado. Supondes que,
como vós, também eu não perquiro? Vós pesquisais o perispírito; nós outros, agora,
pesquisamos a alma. Esperai, pois." L-amennais.
Assim, Espíritos, que podemos considerar adiantados, ainda não conseguiram sondar a natureza da alma. Como poderíamos nós fazê-lo? E, portanto, perder tempo querer perscrutar o principio das coisas que, como foi dito em O Livro dos Espíritos (ns. 17 e 49), está nos segredos de Deus. Pretender esquadrinhar, com o auxílio do Espiritismo, o que escapa à alçada da humanidade, é desviá-lo do seu verdadeiro objetivo, é fazer como a criança que quisesse saber tanto quanto o velho. Aplique o homem o Espiritismo em aperfeiçoar-se moralmente, eis o essencial. O mais não passa de curiosidade estéril e muitas vezes orgulhosa, cuja satisfação não o faria adiantar um passo. O único meio de nos adiantarmos consiste em nos tornarmos melhores. Os Espíritos que ditaram o livro que lhes traz o nome demonstraram a sua sabedoria, mantendo-se, pelo que concerne ao princípio das coisas, dentro dos limites que Deus não permite sejam ultrapassados e deixando aos Espíritos sistemáticos e presunçosos a responsabilidade das teorias prematuras e errôneas, mais sedutoras do que sólidas, e que um dia virão a cair, ante a razão, como tantas outras surgidas dos cérebros humanos. Eles, ao justo, só disseram o que era preciso para que o homem compreendesse o futuro que o aguarda e para, por essa maneira, animá-lo à prática do bem. (Vede, aqui, adiante, na 2ª parte, o cap. 1º: Da ação dos Espíritos sobre a matéria.)

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