Reunião Publica (181): O Evangelho Segundo o Espiritismo

Ano IX - 19/01/2014

CAPÍTULO XVI - NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMON
Utilidade providencial da riqueza. Provas da riqueza e da miséria
7. Se a riqueza houvesse de constituir obstáculo absoluto à salvação dos que a
possuem, conforme se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a
letra e não segundo o espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns um
instrumento de perdição,sem apelação nenhuma, idéia que repugna à razão. Sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá
causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova
muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do orgulho, do
egoísmo e da vida sensual. E o laço mais forte que prende o homem à Terra e lhe desvia do
céu os pensamentos. Produz tal vertigem que, muitas vezes, aquele que passa da miséria à
riqueza esquece de pronto a sua primeira condição, os que com ele a partilharam, os que o
ajudaram, e faz-se insensível, egoísta e vão. Mas, do fato de a riqueza tornar difícil a jornada,
não se segue que a torne impossível e não possa vir a ser um meio de salvação para o que dela
sabe servir-se, como certos venenos podem restituir a saúde, se empregados a propósito e
com discernimento.
Quando Jesus disse ao moço que o inquiria sobre os meios de ganhar a vida eterna:
"Desfase-te de todos os teus bens e segue-me", não pretendeu, decerto, estabelecer como
princípio absoluto que cada um deva despojar-se do que possui e que a salvação só a esse
preço se obtém; mas, apenas mostrar que o apego aos bens terrenos é um obstáculo à
salvação. Aquele moço, com efeito, se julgava quite porque observara certos mandamentos e,
no entanto, recusava-se à idéia de abandonar os bens de que era dono. Seu desejo de obter a
vida eterna não ia até ao extremo de adquiri-la com sacrifício.
O que Jesus lhe propunha era uma prova decisiva, destinada a pôr a nu o fundo do seu
pensamento. Ele podia, sem dúvida, ser um homem perfeitamente honesto na opinião do
mundo, não causar dano a ninguém, não maldizer do próximo, não ser vão, nem orgulhoso,
honrar a seu pai e a sua mãe. Mas, não tinha a verdadeira caridade; sua virtude não chegava
até à abnegação. Isso o que Jesus quis demonstrar. Fazia uma aplicação do princípio: "Fora da
caridade não há salvação".
A conseqüência dessas palavras, em sua acepção rigorosa, seria a abolição da riqueza
por prejudicial à felicidade futura e como causa de uma imensidade de males na Terra; seria, ao demais, a condenação do trabalho que a pode granjear; conseqüência absurda, que
reconduziria o homem à vida selvagem e que, por isso mesmo, estaria em contradição com a
lei do progresso, que é lei de Deus.
Se a riqueza é causa de muitos males, se exacerba tanto as más paixões, se provoca
mesmo tantos crimes, não é a ela que devemos inculpar, mas ao homem, que dela abusa,
como de todos os dons de Deus. Pelo abuso, ele torna pernicioso o que lhe poderia ser de
maior utilidade. E a conseqüência do estado de inferioridade do mundo terrestre. Se a riqueza
somente males houvesse de produzir, Deus não a teria posto na Terra. Compete ao homem
fazê-la produzir o bem. Se não é um elemento direto de progresso moral, é, sem contestação,
poderoso elemento de progresso intelectual.
Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta.
Cabe-lhe desobstrui-lo, saneá-lo, dispô-lo para receber um dia toda a população que a sua
extensão comporta. Para alimentar essa população que cresce incessantemente, preciso se faz
aumentar a produção. Se a produção de um país é insuficiente, será necessário buscá-la fora.
Por isso mesmo, as relações entre os povos constituem uma necessidade. A fim de mais as
facilitar, cumpre sejam destruídos os obstáculos materiais que os separam e tornadas mais
rápidas as comunicações. Para trabalhos que são obra dos séculos, teve o homem de extrair os
materiais até das entranhas da terra; procurou na Ciência os meios de os executar com maior
segurança e rapidez. Mas, para os levar a efeito, precisa de recursos: a necessidade fê-lo criar
a riqueza, como o fez descobrir a Ciência. A atividade que esses mesmos trabalhos impõem
lhe amplia e desenvolve a inteligência, e essa inteligência que ele concentra, primeiro, na
satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes
verdades morais. Sendo a riqueza o meio primordial de execução, sem ela não mais grandes
trabalhos, nem atividade, nem estimulante, nem pesquisas. Com razão, pois, é a riqueza
considerada elemento de progresso.

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